Acção de Repovoamento de uma Zona de Caça com Perdiz Vermelha
Um exemplo a seguir
1.
Caracterização da Zona de Caça
A zona de caça objecto deste artigo situa-se na zona oeste do país, no concelho de Sintra.
A referida zona de caça tem uma área aprox. de 600 hectares, grande parte da qual encontra-se localizada numa extensa planície, no meio da qual existe uma
charca natural de grande dimensão.
A reserva em questão caracteriza-se por ser uma zona plana, muito soalheira, possuindo inúmeras valas de água, muito sujas de mato, pouco arborizada e com
terrenos relativamente húmidos.
A maior parte da zona de caça está localizada em terrenos que integram a Reserva Agrícola Nacional, predominando aí a agricultura do trigo e do milho.
Gostaríamos de chamar a atenção para uma realidade muito importante: o facto da agricultura nos terrenos que integram a zona de caça ser de sequeiro, leva
a que as cearas de trigo sejam colhidas apenas em fins de Julho, proporcionando abrigo e excelentes condições de nidificação à perdiz; já a cultura do
milho, prolongando-se pelos meses de Agosto e Setembro, proporciona complementarmente abrigo à perdiz; ambas as culturas – trigo e milho – depois de
colhidas, acabam ainda por proporcionar, desfasadas no tempo – outro aspecto positivo – alimentação à perdiz.
A maior parte da zona de caça é circundada por estradas relativamente movimentadas de viaturas. Esta situação, caracterizada por condições de ruído
constantes, quer diurnas, quer nocturnas, prejudica qualquer acção de repovoamento, pois uma das condições para o respectivo sucesso é a ausência de
perturbação. Com efeito, a direcção da referida zona de caça pôde constatar, inicialmente, uma grande dificuldade na fixação das perdizes objecto da
primeira acção de repovoamento no Verão. Confrontados com este problema, os serviços técnicos da Qta. dos Penedinhos propuseram à direcção da zona de caça,
no verão de 2015, a utilização de uma técnica para fixação das perdizes que adiante descreveremos em pormenor, com resultados obtidos bastante positivos.
2.
Estratégia de Repovoamento
A associação que gere a referida zona de caça, de há quatro anos para cá, tem mantido a mesma estratégia de repovoamento anual, com excelentes resultados
como adiante veremos.
O repovoamento tem-se caracterizado por duas acções principais: a primeira, realizada no Verão, nos meses de Junho e Julho; a segunda (reforço),
realizada sensivelmente a meio da época de caça, i.e. em Novembro.
Na primeira acção, o repovoamento é efectuado com perdizes com 14 semanas de idade.
Na segunda acção, ou reforço, as perdizes soltas no terreno são já adultas
.
É importante realçar o seguinte aspecto: As primeiras perdizes soltas no verão com 14 semanas, i.e. 3 meses de idade, atingirão a maturidade sexual
passados 7 meses, ou seja, estarão preparadas para acasalar (e nidificar) a partir de Fevereiro do ano seguinte.
Claro está que, para isso, terão de ter sobrevivido à época de caça. Mas também não é menos verdade que a solta das segundas perdizes a meio da época de
caça aumentará a probabilidade de sobrevivência das primeiras, mais bravas e adaptadas ao terreno e, assim, com maior capacidade de fuga.
Outro aspecto não menos importante reside no facto das perdizes soltas durante a época de caça com uma idade média presumível de 5 meses, só atingirem a
maturidade sexual em Abril ou Maio do ano seguinte; estas perdizes já não acasalarão, nem nidificarão!
Referimos, no capítulo anterior, a dificuldade verificada pela associação relativa à fixação das primeiras perdizes provocada pelo ruído das viaturas
que circulam nas estradas que circundam a zona de caça. Por forma a ultrapassar este problema, os serviços técnicos da Qta. dos Penedinhos recomendaram
a instalação, em cada ponto de solta, de um perdigão adulto enjaulado com o propósito de “chamar” constantemente o bando de perdizes para junto de si
e, assim, melhorar o nível de fixação, tanto das perdizes recém-libertadas, como das restantes adultas.
3.
Preparação da Zona de Caça
Antes da largada das perdizes no terreno, foi feito um planeamento cuidadoso de um conjunto de acções com vista a assegurar às futuras aves:
a) as melhores condições de abrigo;
b) a disponibilidade de água e de alimento;
c) as melhores condições de fixação (ausência de perturbação).
Os abrigos escolhidos e instalados pela associação foram os do tipo rústico, “amigos” do ambiente , económicos e fáceis de montar.
Junto aos abrigos, e protegidos por malha sol, foram colocados comedouros (garrafão invertido) e bebedouros de campo.
Próximo dos pontos de solta foram, por fim, instaladas as jaulas com os perdigões adultos.
No que respeita ao nível de perturbação das perdizes, refira-se a existência de predadores terrestres – saca-rabos, gatos semi-bravos, ginetes – e aéreos –
águias – . De resto, como já se viu, por se tratar de uma zona eminentemente agrícola, a perturbação das perdizes pelo Homem é relativamente reduzida. A
maior fonte de perturbação reside, de facto, no ruído das viaturas à volta da zona de caça.
4.
Factores Críticos de Sucesso (FCS)
4.1.
Nível de Integração de Abrigo, Água, Alimentação e Ausência de Perturbação.
Tratando-se de uma zona predominantemente agrícola, com trigo e milho de sequeiro, rasgada por inúmeras valas de água muito sujas de mato, a direcção da
zona de caça optou, a nosso ver muito bem, pelo aproveitamento do referido mato para proporcionar o abrigo indispensável às perdizes recém-introduzidas.
Chamamos a atenção do leitor para o facto da disposição das culturas, entrecortadas pelas valas sujas de mato, apresentar a forma de um mosaico [1], tal como sempre temos defendido.
Outro aspecto não menos importante reside no facto das referidas culturas de trigo e milho, sendo de sequeiro, serem colhidas tardiamente: o trigo no final
de Julho, princípio de Agosto; e o milho no final de Setembro. Estas circunstâncias acabam por ter um efeito positivo no abrigo e na alimentação das
perdizes, tanto das que foram soltas no verão, como nas adultas que terão transitado de anos anteriores.
Chegados aqui, urge sublinhar a importância das referidas culturas e da respectiva disposição em forma de mosaico para a conclusão bem sucedida do processo
de reprodução (nidificação) das perdizes adultas, incluindo o abrigo, a alimentação e a água abundantes, indispensáveis também para o desenvolvimento dos
perdigotos.
Outra decisão, que merece o nosso elogio, foi a selecção dos locais para a introdução dos comedouros e dos bebedouros. Com efeito, os comedouros, bem como
os bebedouros, foram colocados na orla das sementeiras, próximos das sebes junto às valas, que hão-de servir de abrigo às perdizes, e protegidos do sol.
Por forma a minimizar a perturbação decorrente dos predadores e do ruído das viaturas, e maximizar a fixação das perdizes jovens e adultas, a direcção da
zona de caça seguiu a nossa sugestão de colocar em cada ponto de solta estratégicamente selecionado um perdigão adulto numa gaiola.
5.
Resultados.
Em fins de Julho de 2016 foram contabilizados 14 casais de Perdiz Vermelha acompanhados de um total de 87 perdigotos com uma idade média estimada de 8
semanas.
A contagem revelou um casal com apenas 2 perdigotos (mínimo) e um casal com 10 perdigotos (máximo).
Este números revelam uma média de 6,2 perdigotos por casal.
6.
Considerações Finais.
Em face do exposto, devemos chamar a atenção dos leitores para a forma sistemática como se vêm implantando, de há 4 anos para cá, no terreno a Alimentação
(zonas semeadas) e o Abrigo (mato rasteiro), i.e. em forma de mosaico: sementeiras separadas por orlas de mato.
Devemos enaltecer também o facto da referida zona de caça ter conseguido obter um bom nível de integração dos principais factores críticos de sucesso de
uma acção de repovoamento: Abrigo, Água, Alimentação e Ausência de Perturbação.
Tudo isto é muito importante e necessário para o sucesso de qualquer acção de repovoamento com Perdiz Vermelha. Mas não é suficiente, pois se a qualidade
das perdizes – traduzida na maior ou menor capacidade de sobrevivência em condições ambientais naturais – que se colocam no terreno não fôr boa, o
repovoamento poderá ser um fracasso.
As perdizes da Quinta dos Penedinhos têm-se revelado de superior qualidade nas acções de repovoamento em que têm participado, porque:
a) Evidenciam uma pureza e bravura genética notável desde os primeiros dias;
b) Estão habituadas, desde muito cedo, ao consumo de diversos cereais;
c) Estão habituadas, desde as primeiras semanas, a um tipo de comedouro muito económico e fácil de instalar em qualquer zona de caça: garrafão de plástico
invertido.
d) Permanecem, a partir das 12 semanas, nos parques de voo, habituando-se a enfrentar todas as condições meteorológicas por mais adversas que sejam.
Estes procedimentos garantem uma excelente adaptação das nossas perdizes às condições naturais de qualquer zona de caça.
Para além de tudo o que atrás referimos, importa por fim realçar a importância da estratégia de repovoamento adoptada em dois tempos, a saber: uma
primeira solta de perdizes no verão (junho-julho) e um ou vários reforços durante a época de caça (Outubro-Novembro).
A terminar, queremos manifestar os nossos agradecimentos à Direcção do Clube de Caçadores da Freguesia de Colares pela confiança depositada na Quinta do
Penedinhos e pela disponibilização de fotos e de informações sobre a acção de repovoamento levada a cabo.
Quinta dos Penedinhos, 24 de Agosto de 2016
A Direcção.
[1]
Defendemos o repovoamento baseado no Mosaico Estratégico, um modelo desenvolvido pela Qta. dos Penedinhos.