- Naquele tempo ainda não havia caça (perdizes) de cativeiro.
Naquele tempo ainda não havia caça (perdizes) de cativeiro. Estávamos no final da década de 60 do século passado.
Eu, os meus pais e a minha avó tínhamos deixado a casa principal da família em Salvaterra do Extremo e dirigíamo-nos para uma casa de campo na freguesia de Toulões. A primeira parte do caminho (15 km) já era alcatroado; correspondia à E.N. que ligava Salvaterra do Extremo a Castelo Branco. A partir de certa altura tínhamos de deixar a E.N. e entrar num caminho de terra batida (textualmente!), impróprio para viaturas ligeiras de passageiros, até chegar à dita casa de campo.
Neste caminho, o pó que o carro levantava era tanto que, ou fechávamos as janelas e sofríamos com o calor (naquele tempo ainda não havia AC nos carros!), ou abríamos as janelas e sofríamos com o pó apesar de costumarmos colocar um lenço a tapar o nariz e a boca tipo assaltantes dos filmes de cowboy. Eram ca. de 15 km de “suplício” que durava aprox. 45 minutos, até chegarmos ao paraíso (casa).
Estávamos no Verão. O meu pai conduzia, a minha avó ia no lugar do “morto”, eu e a minha mãe atrás. Estávamos a menos de 5 km de casa; à nossa esquerda havia uma charca grande e o campo, de um lado e outro do caminho, enchia-se de velhos e frondosos sobreiros e searas de trigo. Eis senão oiço o meu pai e a minha avó em uníssono «Olha uma perdiz! E uma ninhada de perdigotos atrás!».
A minha mãe e eu debruçámo-nos de imediato sobre o banco da frente para admirarmos aquele quadro. A perdiz e os seus perdigotos tinham cruzado o caminho da esquerda para a direita à frente do nosso carro e num ápice deixámos de os ver “embrulhados” no meio da seara de trigo.
Decorridos mais de 50 anos desde este episódio, lembro-me como se fosso hoje, a alegria estampada nos rostos e na voz do meu pai e da minha avó ao avistar aquela perdiz com a sua ninhada.
Do lado paterno, descendo de uma família oriunda da zona da raia, de Salvaterra do Extremo, Concelho de Idanha-A-Nova, Distrito de Castelo Branco. O meu tetra-avô terá sido original de Cáceres e veio a estabelecer-se em S. do Extremo onde casou com uma senhora portuguesa.
Seguramente por isso, ainda me lembro de ter ido com o meu pai visitar uns primos na aldeia do lado de lá do rio Erges (afluente do Tejo) chamada Zarza-LA-Mayor. Zarza fica a ca. de 5 km a pé de Salvaterra. No verão, atravessava-se, já nessa altura, por levar pouca água, o rio Erges (que faz fronteira entre Portugal e Espanha) a salto.
Foi o que fizemos, eu e o meu pai, num daqueles dias de verão, para ir visitar os primos espanhóis. Demorámos 1 hora para lá chegar e outro tanto para regressar a Salvaterra. Ficámos por lá algum tempo a refrescarmo-nos com uma coca-cola genuína (naquele tempo, não havia coca-cola à venda em Portugal!) e um belo presunto pata negra acompanhado dos famosos “picos”.
E assisti a uma manifestação de verdadeira amizade e carinho entre os primos espanhóis e o meu pai e saudades de tempos idos por ocasião das festas da Zarza que atraíam gente de todo o lado.
A partir de determinada altura, a minha avó, nascida em Castelo Branco, e tendo vivido a sua mocidade em Salvaterra do Extremo, veio para Lisboa “a reboque” do marido, oficial de Cavalaria, e já na companhia de dois filhos adolescentes: o meu pai e o meu tio.
Naquele tempo ainda não havia caça (perdizes) de cativeiro.
Em Lisboa, para uma família de não-caçadores, comer uma perdiz de escabeche era um luxo muito apetecível, tanto mais para uma família oriunda da província, sempre acostumada a esta iguaria.
Lembro-me das perdizes penduradas no alpendre da entrada das melhores charcutarias de Lisboa. Lembro-me de fazer questão de acompanhar a minha mãe na compra das perdizes. E havia sempre quem não torcesse o nariz a depená-las e eviscerá-las. A receita das perdizes de escabeche da minha avó tem seguramente raízes espanholas… É deliciosa! Hei-de divulgá-la noutra ocasião.
Lembro-me de estar à mesa à espera das perdizes e ouvir a minha avó avisar: cuidado com os chumbos!
Quando olho para trás, acho tudo isto espantoso, lindo, genuino. O bem-estar e a segurança alimentar doutros tempos… Que saudades!
2. E hoje em dia, o que acontece?
Atualmente, onde a caça de cativeiro (perdizes e outros) é uma realidade incontornável, o bem-estar dos animais criados em cativeiro, bem como a segurança alimentar são temas que merecem o devido destaque e respeito.
Em conversa há uns tempos atrás (estávamos em plena pandemia do COVID-19) com um cliente da zona do Vimieiro, contou-me ele que havia organizado uma montaria aos javalis (no âmbito da política de controle de densidade desta espécie) e que a maioria dos caçadores participantes não tinha levado consigo as peças que lhes estavam por direito reservadas; ou por não saber, ou não querer esfolá-las e eviscerá-las, ou por desconfiança da qualidade da carne.
Esta situação colocou-lhe desde logo o problema de se livrar das carcaças dos animais em tempo útil por forma a evitar o desperdício daquela quantidade significativa de carne de boa qualidade. Imagino que situações deste tipo devem acontecer frequentemente noutras partes do país.
O mesmo acontece com frequência na caça às perdizes; muitos caçadores oferecem as peças abatidas pelas mesmas razões supra referidas.
Contudo, também conheço o caso de uma zona de caça próxima de Borba devidamente organizada onde os javalis abatidos em noites de espera são imediatamente esfolados, eviscerados, sangrados e devidamente esquartejados, embalados e colocados em frio para posterior transporte pelos caçadores.
Estou em crer que não será caso único e que também situações deste tipo deverão proliferar no país. Recordo-me, ainda, de participar num petisco de coelho bravo frito em azeite com alho e coentros caçado nessa madrugada: Que delícia! Neste caso, impera, sem dúvida, a confiança na qualidade da carne dos animais caçados. Um exemplo a ser seguido!
A Quinta dos Penedinhos, ciente da importância destes temas, procurou, desde sempre, desenvolver e implementar métodos de criação adaptados às duas espécies de caça-menor – coelho bravo e perdiz vermelha – focados, entre outros, no bem-estar e na qualidade e sabor da carne dos animais.
Com efeito, procedemos ao controlo diário da qualidade das rações e dos cereais que adquirimos. Já por si adquiridos a empresas (algumas multinacionais) de primeira categoria. Procedemos ao tratamento e controlo sistemático da qualidade da água de bebida dos animais. Asseguramos uma higienização diária e apropriada das instalações, incluindo dos terrenos afetos à criação das perdizes.
No que diz respeito à criação dos animais, procuramos minimizar a administração de medicamentos, nomeadamente de antibióticos, salvaguardando sempre os prazos de segurança definidos nas respetivas fichas técnicas, assim como procuramos atingir níveis de densidade animal aceitáveis, assegurando o bem-estar dos mesmos.
Procedemos, ainda, à desparasitação periódica dos animais.
Todos estes procedimentos são devidamente registados e integram o sistema de qualidade da nossa firma. Todas estas ações são superiormente supervisionadas pelo veterinário assistente da exploração.
Em face do exposto, estamos em crer que os animais criados na Quinta dos Penedinhos satisfazem, de uma maneira geral, os melhores padrões de bem-estar animal e segurança alimentar na ótica dos consumidores/caçadores, refletidos, desde logo, na qualidade e sabor da carne do coelho bravo e da perdiz vermelha.
Para mim, que me lembro bem do sabor de uma perdiz do tempo em que não havia caça (perdizes) de cativeiro, quando provo uma perdiz adulta(!), nascida e criada na Quinta dos Penedinhos, não sinto grande diferença! Só mesmo a falta dos chumbos!
O mesmo digo dos coelhos.
Sintra, 17 de Agosto de 2022.